domingo, 30 de janeiro de 2011

COISAS QUE NÃO ENTENDO

Ainda há muita gente boa neste mundo, graças a Deus, apesar da crescente alienação e individualismo da sociedade em relação aos nossos jovens e crianças, impelindo-os  cada vez mais cedo para todas as formas de abandono.
Mas, como disse, ainda há muitas pessoas boas neste mundo. Duas delas eu conheço pessoalmente: Laura e Angelita. Bem poderiam ser duas personagens de um triste romance, mas são reais, de carne e osso, e coração.

Angelita foi minha professora de italiano. Diria que conheci a autora antes de sua obra, pois somente no decorrer do curso é que fui tomando conhecimento da grandeza deste ser humano e da obra hercúlea que empreende todos os dias.
Ela dava aulas à noite pra se manter, porque não retirava para si nem um centavo do seu trabalho diurno, que é o de abrigar mais de 70 crianças e jovens, numa creche que fundou e mantém, a duras penas.
É brasileira, mas viveu por 16 anos na Itália como freira. Abriu mão da sua vida no convento porque achava ser mais útil aqui fora e assim, com pouquíssimo dinheiro e quase mais nenhuma fé voltou para o Brasil e até hoje tenta a todo custo continuar a sua obra.

Uma noite, ao perceber seus olhos inchados de tanto chorar, perguntei-lhe a razão e ela desabafou dizendo que se sentira muito humilhada naquele dia, num supermercado, quando ao pedir frutas e verduras lhe mandaram escolher dentre as estragadas que já iam pro lixo. Além de ser obrigada a peregrinar todos os dias em busca desses alimentos porque não dispunha de contribuições fixas mensais, ainda tinha que se submeter ao descaso de quem poderia dar um pouco mais de si. Me disse que chorara mais pelas crianças que por si mesma.
Me lembrei nesse dia de uma outra amiga que uma vez me dissera que pagamos o dízimo na verdade muitas vezes pra delegar a outras pessoas a tarefa de “pôr a mão na massa.”. Angelita é uma dessas que literalmente põe a mão na massa. Ela não só cuida e dá educação às suas crianças, mas o faz com amor verdadeiro. Envolve-se com elas, abraça-as e beija-as, e penteia seus cabelos.
Algumas até dormem na sua casa nos finais de semana. Isso não é pra qualquer um.

Laura é a sua amiga italiana e eu não sei por qual das duas tenho maior admiração. Elas se conheceram ainda na Itália e  Laura encantou-se tanto com a obra da amiga que resolveu se juntar a ela. Veio para o Brasil como turista e aqui ficou. Melhor dizendo, tenta ficar até hoje, porque é obrigada a voltar para a Itália duas vezes por ano, devido a dificuldade de não ter conseguido ainda seu visto permanente. Passa seis meses aqui e seis meses lá. Nos meses em que volta para o seu país arrecada e junta dinheiro para ajudar como pode nos seis meses em que vive aqui. Aliás, a maior parte dos recursos de que dispõem é justamente das doações que ela consegue de lá. Ela me diz que a dor que sente é comparada à uma mãe que se vê obrigada a abandonar os filhos durante vários meses, todos os anos, sem nem ao menos poder lhes dar uma explicação convincente.

O que essas duas passam no seu cotidiano é de revoltar quem as conhece como eu. Não raras vezes já pensaram em desistir, por pura desesperança. Ainda bem que em todas as vezes o amor lhes faz continuarem. Vou morrer sem conseguir entender porque as pessoas que realmente querem fazer algo de útil para a sociedade têm que passar por tamanhas dificuldades.

Bem poderiam ser personagens de um romance, mas Angelita, Laura e as crianças existem de verdade. Em Ji-Paraná, na Creche Grilo Falante.
À Laura, que parte no próximo dia 27, mais uma vez, para a Itália digo o que costumo dizer a todos os meus amigos, antes de uma viagem:
- Vai (e volta) com Deus, minha amiga!


14/08/10

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